terça-feira, 19 de agosto de 2014

(1979) Woyzeck

Alemanha (República Tcheca) | 81min | 35 mm |cor
Roteiro: Werner Herzog, baseado em peça de Georg Büchner
Produção e direção: Werner Herzog
Som: Harald Maury
Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus
Fotografia: Jorg Schmidt-Reitwein
Música: excertos de Fiedelquartett Tele, Rudolf Obruca, Benedetto Marcello e Antonio Vivaldi
Elenco: Klaus Kinski (Woyzeck), Eva Mattes (Marie), Wolfgang Reichmann
(Hauptmann), Willy Semmelrogge (médico), Josef Bierbichler
(primeiro-tambor), Paul Burian (Andres), Volker Prechtel (criado),
Dieter Augustin (Market Crier), Irm Hermann (Margret), Wolfgang
Bächler (Jude), Rosy- Rosy Heinikel (Käthe), Herbert Fux (Subaltern),
Thomas Mettke (taverneiro), Maria Mettke (taverneira)


"O texto e as imagens transmitem uma impressão de desamparo perante os acontecimentos: há algo maior que tomou controle desses personagens que esperaram por nada mais que aproveitar seu pequeno pedaço de terra. A palavra immerzu é usada frequentemente no filme, e ainda que seja traduzido como ‘sem cessar’, isso carrega a conotação de algo que não dá descanso, que não dá alívio, o que reflete o constante ataque sobre o vitimizado Woyzeck.” ¹


Angústia personificada

Apenas cinco dias após o término dos trabalhos em Nosferatu, Herzog pegou o protagonista, e mais toda a equipe de filmagem, e começou a rodar seu antigo projeto de filmar a última e mais célebre peça do dramaturgo alemão Georg Büchner (1813–1837), a fragmentária Woyzeck.


Exceção a algumas contextualizações, o filme é fiel à peça: o soldado raso Woyzeck, sujeito humilde e sem confiança, humilhado pelos de patente mais alta, participa de um experimento ‘científico’ no qual precisa se alimentar somente de ervilhas, por meses. Tudo para arranjar dinheiro para casar com Eva, que rejeita seus avanços por ele não ter nem dinheiro para sustentar direito o filho deles, nem para formalizar o casamento. Ao mesmo tempo ela o trai acintosamente com o primeiro-tambor do Exército, mais forte e mais bonito. A traição e a constante humilhação, junto com a confusão mental que a inusitada dieta traz, acaba fazendo com que Woyzeck mate a esposa, para cometer suicídio em seguida.

Assim como em sua versão para Nosferatu, de Murnau, Herzog filmou a peça de Büchner pretendendo inserir sua obra (e todo o Novo Cinema Alemão) na tradição artística germânica que havia sido interrompida com a ascensão do nazismo. Em suas palavras: “Fazer um filme de Woyzeck significou buscar o mais significativo da história cultural da Alemanha, e por isso há algo no filme que está além de mim. Algo que toca os cumes dourados da cultura alemã, e por isso o filme brilha. Ainda que tudo que eu tenha feito foi buscar e tocar essas alturas”. ²
Mulher infiel

Não é preciso pensar muito para concluir que Woyzeck é mais um (im)perfeito anti-herói herzogiano: confuso, deslocado e humilhado. Está no mundo, sem, no entanto, fazer parte dele.


Há claros parentescos com Kaspar Hauser, no modo como o cientificismo o subestima, subjuga e traça vereditos para seu comportamento, e com Stroszek (o de Bruno S), dado o jeito como certos aspectos da sociedade lhe são negados por sua condição social inferior.


Para Woyzeck, como para os supracitados, sua existência precária é inescapável: não há saída desse carrossel (que, aliás, aparece com as mesmas cores do vestido de Eva quando é apanhada dançando com o primeiro-tambor) que gira indefinidamente, sem ir a parte alguma, Tal como os caminhões em Auch Zwerge Haben Klein Angefangen e Stroszek – e neste, também a infame galinha –, ou mesmo os moinhos de Lebenszeichen, a vida é um fado (e um fardo) inescapável. Como Bruno S em Stroszek e Jeder Für Sich Und Gott Gegen Alle, só a morte é redentora dessa existência de puro desterro.

E a força do filme reside no fato de que, mais do que em qualquer outro filme, esse peso do mundo inteiro recai sobre os ombros do protagonista: ao contrário de outras obras, em que havia coadujuvantes bizarros e animais grotescos dividindo a missão de mostrar os conceitos de natureza hostil do diretor, em Woyzeck toda essa angústia se derrama sobre o rosto extenuado de Klaus Kinsi, seguramente em seu maior papel. Nas palavras do crítico norte-americano de cinema Vincent Canby (1924–2000): “O Senhor Kinski, com seu rosto profundamente vincado que é simultaneamente jovial e antigo, parece alguém a quem a morte concedeu misericórdia. Assim que colocamos os olhos sobre ele, ele está tomado por demônios”. ³

A estudiosa de cinema Lúcia Nagib acrescenta: “É justamente isso que se espera de um personagem de Büchner: gestos cortantes, feições que se distorcem e puxam ao grotesco, pronúncias marcadas e propositadamente artificiais, contrastes, enfim, já que eles estão presentes em cada linha do texto”. 4

Herzog, que pretendia usar exatamente a exaustão do ator para dar mais veracidade e intensidade à angústia do personagem principal, completa: “Kinski nunca foi um ator que meramente disse suas falas. Ele se exauria completamente, e após Nosferatu ele permaneceu profundamente no mundo que criamos juntos, isso estava muito claro desde o primeiro dia em que caminhamos pelo set de Woyzeck. Ele realmente deu à sua performance uma qualidade diferente desde a cena de abertura, em que ele parece estar tão frágil e vulnerável. Olhe para ele nessa sequência, quando ele está olhando fixamente para a câmera. Há algo que não está bem em seu rosto. Ele está verdadeiramente inchado em um dos lados.5

Eu já tinha visto este filme algumas vezes na década passada, pois frequentemente ele era reprisado na TV Cultura (junto com Mein Liebster Feind, de 1999), e confesso que não me chamava muito a atenção, eu o considerava um filme menor na carreira de Herzog – achava o protagonista exagerado, e no máximo ria do inusitado da dieta de ervilhas, que obviamente o enlouquecia.

Porém, revendo nesse final de semana, uns oito anos mais velho, e após ver tantos filmes do diretor, ainda mais nesse contexto de estudá-lo e reconhecer seus padrões, vejo com um dos mais belos e tocantes de sua filmografia.

Ao contrário da grotesquidão de filmes imediatamente anteriores, a angústia e o desamparo que Woyzeck transpira vem com traços de melancolia e romantismo que têm mais a ver com Lebenszeichen e Die Große Ekstase Des Bildschnitzers Steiner

Lúcia Nagib teoriza: “O filme de Herzog transmite [com suas paisagens] uma delicadeza na exposição não-verbal dos sentimentos do personagem central que só presenciáramos antes em Jeder Für Sich Und Gott Gegen Alle (filme, como dissemos, já concebido sob influência de Büchner)”. 6

A cena em que o protagonista, desesperado, corre pateticamente, falando sozinho, pelos campos floridos, até cair, desajeitado, é talvez a coisa cena mais sublime que o alemão já filmou. Todo mundo que já teve o coração e o espírito alquebrados, partidos, pela existência, pode pegar nas mãos a dor que atormenta Woyzeck nesse momento febril. 


Todo o peso do mundo

E enfim, quando se consuma o assassinato, e o posterior suicídio, Woyzeck é a maior vítima (por isso a vítima não é mostrada durante o assassínio), pois mata a si mesmo duas vezes: primeiro em desespero, depois em amargura. Não se vinga nem do oficial, nem do cientista, nem dos jocoso colegas, nem do primeiro-tambor, não prova à esposa infiel seu valor – ao contrário, acaba todas as chances disso – e só pelo suicídio põe fim ao seu malogrado fado, a derradeira vitimização.

Como diz a estudiosa italiana de cinema Grazia Paganelli: “O gesto sai de cena porque a música, sozinha, basta como único vestígio para o descrever e ampliar. O grito que se ouve é um grito de dor que ressoa para além da violência de da morte, naquilo que poderia ser considerado um melodrama trágico e negro, que não conhece paz por causa da tensão desesperada com a qual o protagonista atravessa a sua própria história.7

Morrendo duas vezes

Quanto ao final, em que os legistas encontram ambos os corpos, o estudioso norte-americano de cinema Brad Prager destaca: “A epígrafe final ‘Um bom assassinato, um verdadeiro assassinato, um belo assassinato, tão belo quanto um homem pode esperarr ver, não tínhamos igual a esse havia tempos’ poderia ser conectada aos momentos finais de Jeder Für Sich Und Gott Gegen Alle”. 8

É o retrato de uma cultura ao mesmo tempo indiferente e fascinada ante às suas próprias crueldades. Não há redenção nem na ciência, nem no primitivismo. Homens, animais, acaso, destino, tudo leva à mesma ruína sem porquê no universo desolado herzogiano.


Curiosidades:

– A abertura do filme é a mesma de Stroszek, um xilofone desafinado tocado por Bruno S.

– Pela performance como Marie, Eva Mattes ganhou o prêmio de melhor atriz coadjuvante no Festival de Cannes em 1979.

– Eva Mattes, que, aliás, já havia participado de Stroszek, como a prostitua Eva, fora namorada de Herzog, e acabou tendo uma filha (Hanna Mattes) com ele em 1980, quando o diretor já era casado com Martje Grohmann (a Mina de Nosferatu).

– A peça de Büchner é inspirada na história real do peruqueiro (sim, peruqueiro) Johann Christian Woyzeck, de Leipzig, que, em 1821, esfaqueou até a morte sua amante Christiane Woost numa crise de ciúme.

Woyzeck foi filmado em 17 dias e editado em apenas cinco.

– Herzog pretendia filmar já no dia seguinte após o término das filmagens de Nosferatu, o que só não ocorreu porque foram precisos alguns dias até que o cabelo de Kinski crescesse novamente para o papel principal.

– A equipe usada em Nosferatu foi reutilizada basicamente porque a burocracia na Tchecoslováquia era tão grande que era mais fácil fingir que ainda estavam filmando a saga vampiresca do que pedir autorização às autoridades locais para filmar outra obra no país.

– Sobre essa economia toda de tempo e equipe, Herzog: “Usamos séries de cenas de quatro minutos, então o filme é essencialmente feito de mais ou menos vinte e cinco corte, mais um par de takes menores. Foi muito difícil de manter isso: a ninguém era permitido errar. Esse foi um filme econômico de um jeito que eu provavelmente nunca mais conseguirei fazer”. 9


¹ 7 PRAGER, Brad. The Cinema Of Werner Herzog: Aesthetic Ecstasy And Truth. Wallflower Press, 2007.
² 5 9 HERZOG, Werner. In: Herzog On Herzog, de Paul Cronin. Editora Faber & Faber, 2001.
³ CANBY, Vincent. In:
http://www.nytimes.com/movie/review?res=950CE3DC1330E631A25757C2A96E9C946890D6CF
4 6 NAGIB, Lúcia. Werner Herzog: O Cinema Como Realidade. Estação Liberdade, 1991.
8 PAGANELLI, Grazia. Sinais De Vida: Werner Herzog E O Cinema (Segni Di Vita: Werner Herzog E Il Cinema, 2008). Editora Indie Lisboa, 2009.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

(1979) Nosferatu


Alemanha (filmado em República Tcheca, na Holanda e no México) | 103min | 35 mm |cor
Roteiro: Werner Herzog, a partir do livro de Bram Stoker e do filme de FW Murnau
Produção e direção: Werner Herzog
Som: Walter Saxer
Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus
Fotografia: Jorg Schmidt-Reitwein
Música: Florian Fricke (Popol Vuh) e excertos Richard Wagner e Charles Gounod
Elenco: Klaus Kinski (Conde Drácula), Isabelle Adjani (Lucy Harker), Bruno Ganz (Jonathan Harker), Jaques Dufilho (capitão), Roland Topor (Renfield), Walter Ledengast (Van Helsing), Dan van Husen (guarda), Roger Berry Losch (primeiro marinheiro), Jan Groth (capitão), Carster Bodinus (Schrader), Martje Grohmann (Mina), Ryk de Gooyer (oficial), Clemens Scheitz (oficial de justiça), Lo van Hensbergen (inspetor), John Leddy (cocheiro), Margiet van Hartingsveld (empregada), Beverly Walker (madre-superiora)


[Não vou fazer comparações com a obra-prima de Murnau aqui, pois sairia muito do escopo deste blog, além de demandar muito tempo para quem ainda tem dezenas de filmes para percorrer. A versão de Herzog tem força e personalidades suficientes para ser analisada por si só, além de não ser tão fiel nem ao filme-homenageado (a despeito de haver cenas iguais, como homenagem), nem ao livro original.]

Uma vez que todo mundo conhece a história original (pelo menos é isso que Herzog supõe) – o jovem Jonathan Harker vai à Transilvânia fechar o contrato da venda de uma casa para o tal Conde Drácula, e chegando lá em seu castelo percebe que ele é um tipo um tanto excêntrico, e que talvez haja bastante encrenca naquele soturno castelo, inclusive para a noiva de Jonathan, e aí sobram mordidas no pescoço de quase todo mundo –, o diretor não perde tempo com apresentações ou construção de personagens.

Nas palavras do alemão: “Meu filme foi totalmente baseado no Nosferatu original, ainda que eu quisesse injetar um espírito diferente nele. No filme de Murnau a criatura é assustadora porque ele não possui alma e parece com um inseto. Mas no vampiro de Kiski você tem a verdadeira angústia existencial humana. Eu tentei ‘humanizá-lo’. Eu quis dotá-lo de sofrimento humano e solidão, com um verdadeiro anseio por amor, e, mais importante, uma característica essencial do ser humano: a mortalidade.” ¹

Assim o filme, de subtítulo Phantom Der Nacht (Fantasma Da Noite), fica bastante livre pra exercícios estilísticos, o que faz deste um dos visualmente mais belos de toda a filmografia herzogiana, num grande trabalho do diretor de fotografia Jörg Schmidt-Reitwein.

Devo mencionar, aliás, que este é, visualmente, o filme mais belo de Werner Herzog. Além do admirável trabalho de fotografia (muito bem ornado pela trilha do Popol Vuh), Nosferatu é a obra em que o olhar genial do diretor, até então sempre direcionado a manifestações mais intuitivas, livres, até caóticas, dá lugar a um grande apuro técnico, em cenas cuidadosamente construídas. 


Belíssima fotografia

Cada sequência merece ter o olhar repousado sobre ela, é um filme para ver e rever de tempos em tempos, com diferentes climas e humores, já que é uma obra de arte bastante sensorial, quase mística. As paisagens, como de praxe na mitologia herzogiana, são personagens importantes, sempre dando o clima preciso de morbidez e melancolia à narrativa.
Todos os personagens parecem perdidos, especialmente o trio principal: Jonathan e Lucy, um casal visivelmente asséptico, infeliz em seu relacionamento idealizado, frio; e Drácula, solitário, melancólico, frustrado. Até Van Helsing, nesta versão, é um personagem fraco, quase patético.

Nina e Jonathan: casal amargurado

Deve-se notar que o elemento água é usado frequentemente no filme, para simbolizar o destino, para o bem e para o mal: Jonathan fica feliz de sair de sua cidade, onde as águas retornam sempre ao mesmo lugar, e ir a Transilvânia; Lucy diz que todos estão condenados porque os rios continuam correndo sem eles, e a morte é a única certeza.

O triângulo (des)amoroso do filme, entre sonho e realidade, amor e morte,  se origina da falta de paixão, da impossibilidade de mudar esse curso d’água que é o destino. Todos estão nas mãos de Drácula (até ele mesmo, em sua solitude), que é a escuridão, o mal, a decrepitude, e por que não, a monotonia do não-ser.

Vampiro amargurado

Como em tantos filmes do diretor, trata-se da inútil luta do ser humano consigo mesmo e com a existência. Nosferatu é obviamente um protagonista herzogiano de tão inadequado, deslocado. E o casal, cada um a seu modo, traz essa desgraça para si, para fazer emergir essa infelicidade, esse horror instintivo que ambos trazem consigo.

Ambos abraçam a destruição ao mesmo tempo em que tentam evitá-la, e o destino do vampiro no final das contas é tão-somente a afirmação de que não se pode enganar a morte: Nosferatu perece, mas ainda vive, em outro corpo, em outra forma.

Festim diabólico

Não há exatamente redenção, são todos incapazes de se realizar ou realizar algo. Do início, com as múmias que servem de memento mori e o voo lento e silencioso do morcego, até o final, em que todos se entregam – Jonathan à loucura e perdição, Lucy ao vampiro e Drácula à destruição.

No final, aliás, Nosferatu não exibe qualquer mensagem de “fim” ou coisa parecida (nem mesmo os créditos), porque dessa forma, para o diretor (como ele diz nos comentários do DVD), "o filme iria continuar dentro de nós, do público".

E continua. Os ratos estão por toda parte, espalhando a pestilência, e todos cantam e se embriagam, em desespero, porque o Sísifo herzogiano só pode fingir que é feliz.

Como tão bem resumiu o crítico norte-americano de cinema Roger Ebert (1942–2013): “’Nosferatu’ não pode ser confinado à categoria de ‘filme de horror’. É sobre sentir medo, e sobre o quão facilmente os incautos podem mergulhar no Mal”. ²


Curiosidades:

Nosferatu foi um dos cinco (!) filmes de vampiro lançados em 1979 – os outros foram Dracula (de John Badham, com Frank Langela), Love At First Bite (comédia de Stan Dragoti), Nocturna (de Harry Hurwitz, com John Carradine), Graf Dracula [Beißt Jetzt] In Oberbayern (de Carl Schenkel ), Thirst (de Ron Hardy) e Salem's Lot (de Tobe Hopper, baseado em história de Stephen King);

– o filme recebeu o Urso de Prata de melhor figurino em Berlim e o prêmio de melhor filme estrangeiro da National Board of Review (ambos em 1979), enquanto, no mesmo ano, Klaus Kinski recebeu o prêmio de melhor ator principal do German Film Awards, e, em 1980, o Pelicano de Ouro do Festival de Cinema de Cartagena por sua atuação;

– as incrivelmente lentas (e difíceis) sequências do morcego voando foram retiradas de um documentário científico;

– as múmias do início do filme são reais, compradas pelo diretor de uma exposição no cemitério da cidade mexicana de Guajuanato, onde houve uma epidemia de cólera em 1833, que vitimou essas pessoas;

– Herzog foi acusado de crueldade com animais por ativistas, pois os 11 mil (!) ratos brancos foram importados da Hungria em condições tão deploráveis que começaram a devorar uns aos outros antes de chegar a Holanda, e os sobreviventes foram pintados de cinza para as filmagens;

– como a obra de Bram Stoker já havia caído em domínio público, Herzog resolveu restaurar os nomes originais do romance, que não puderam ser usados por Murnau (Drácula, por exemplo, era Orlok);

– os personagens Mina e Lucy têm seus papeis invertidos em relação ao livro de Bram Stoker;

– Martje Grohmann, aliás, que interpretou Mina, era esposa de Herzog à época (foram casados de 1967 a 1987), e também trabalhou em Aguirre, Der Zorn Gottes, como assistente de produção, e em Lebenszeichen, como assistente de direção, além de ter traduzido para o inglês o roteiro de Invincible (2001);

– o filho de Herzog e Martje, Rudolph, nascido em 1973, foi roteirista e produtor executivo de The White Diamond (2004), roteirista de Happy People: A Year in the Taiga (2010), diretor-assistente em Glocken Aus Der Tiefe (1993), Gesualdo: Death For Five Voices (1995) e Invincible (2001), além de produtor-assistente em Little Dieter Needs To Fly (1997).

– ao contrário das aziagas jornadas com Klaus Kinski em Aguirre, Der Zorn Gottes e Fitzcarraldo (1982), o inquieto ator, segundo Herzog, “amou o trabalho e estava feliz o tempo todo, ainda que ele fizesse uma birra acada dois dias”; ³

– a maquiagem de Klaus Kinski levava quatro horas para ficar pronta, todos os dias;

– Walter Ledengast, que interpreta Van Helsing, atuou como o professor Daumer em Jeder Für Sich Und Gott Gegen Alle

– outras pontas notáveis são do próprio Herzog, como um dos carregadores do caixão com os ratos, e de Clemens Scheitz, do amigo do protagonista de Stroszek (e que também foi o mordomo Adalbert em Herz Aus Glas), como oficial de justiça;

– os ciganos do vilarejo são “de verdade”, do leste da Eslováquia, e falam entre si no dialeto romani;

– o designer de produção Henning von Gierke, também um chef talentoso que gostava de cozinhar para a equipe, preparou ele mesmo a comida para a cena do café da manhã;

– a equipe inteira de filmagem era composta por 16 pessoas, o dobro de Aguirre, Der Zorn Gottes, e filmou por 7 semanas, após 4–5meses de pré-produção;

– os executivos da Fox, que se interessaram por coproduzir Nosferatu, se espantaram quando viram que o orçamento para o roteiro do filme era de apenas US$ 2 – Herzog afirmou que só tinha precisado de lápis e papel para fazê-lo.


¹ ³ HERZOG, Werner. In: Herzog On Herzog, de Paul Cronin. Editora Faber & Faber, 2001.